O
conjunto das propostas inscritas na proposta de Orçamento do Estado para o ano
de 2015 reforçam e aprofundam as desigualdades sociais, o empobrecimento do
povo e do país, a destruição dos serviços públicos e a aniquilação das funções
sociais do Estado, numa clara opção ideológica e política do governo em
benefício evidente dos grandes grupos económicos nacionais e internacionais.
Em 2015
os portugueses, nomeadamente os trabalhadores e os pensionistas, vão pagar mais
impostos (mais 2.006 milhões de euros) e as empresas, por via da redução da
taxa de IRC, vão acrescentar aos seus lucros muitos milhões de euros.
A
redução do IRS anunciada pelo governo não passa de ficção tendo em conta as
condicionantes colocadas para se efetivar e a introdução de um imposto indireto
(fiscalidade verde), enquanto a redução da taxa de IRC já se encontra em vigor.
Quanto
à fiscalidade verde apresentada como medida para a proteção do ambiente, visa,
no fundamental, obter mais receita fiscal.
A introdução da tributação
sobre o carbono (15€ por tCO2), vai determinar o aumento do preço dos
combustíveis em cerca de 3% com a agravante de aumentar também a contribuição
sobre o setor rodoviário, integrado no ISP, em mais 160 milhões de euros, o que
provocará o aumento das tarifas dos transportes.
Nos
últimos anos, empresas chave em setores estratégicos, como a EDP, a ANA, os
CTT, a Caixa Seguros foram privatizadas. O governo pretende agora concluir a
venda da Caixa Seguros e da EGF, avançar com a privatização da TAP, ainda este
ano, iniciar o processo de concessão da Carris, do Metro de Lisboa e Porto, do
STCP e proceder a novas privatizações em 2015 como a CP Carga e a EMEF.
No que
já é conhecido, o caderno de encargos da subconcessão/privatização dos STCP e
Metro do Porto consagra garantias de equilíbrio
financeiro para as empresas privadas (vulgo lucros garantidos) e sem
qualquer garantia para os utentes nem trabalhadores.
De
facto, no caso de redução de utentes em relação ao número esperado e/ou menores
receitas, as condições da subconcessão serão revistas para que os lucros se
mantenham. No imediato é permitido aos operadores privados que adjudicarem a
subconcessão/privatização reduzir carreiras e frequências em 10% e aumentar
ainda mais as tarifas. È de notar que nos últimos anos as tarifas dos
transportes sofreram aumentos brutais.
Temos
mais uma nova versão das PPPs: o estado fica com as dívidas, os privados ficam
com os lucros e os utentes pagam mais por piores serviços.
O
governo não só avança com a delapidação do património público como se propõe
reduzir de 85 milhões de euros as indemnizações compensatórias para as empresas
públicas de transportes, o que indicia novos ataques aos direitos dos seus
trabalhadores, a redução de serviços e o aumento dos preços dos transportes
para os utentes.
Esta opção
do governo pela privatização destes importantes e estratégicos sectores de atividade
assumem uma gravidade de enormes proporções para os utentes, trabalhadores e
populações, para o país e para a própria economia nacional, em benefício claro
dos interesses dos grandes grupos económicos e financeiros.
Nos
últimos anos temos assistido a uma degradação acentuada dos transportes
públicos e a um brutal aumento das tarifas o que levou à redução drástica do
número de utentes dos transportes. Esta redução resulta da conjugação de dois
fatores: aumento das tarifas e redução da oferta. Ficaram a perder os utentes,
os trabalhadores desta área, o ambiente e mesmo a economia nacional.
Os exemplos ilustrativos destas consequências não faltam.
A RN
foi criada em 1976 e privatizada em 1996 porque, diziam os governantes da
altura “um monopólio estatal não
favorecia as populações”. Vinte e dois anos depois já não há serviço de
transportes rodoviários em grande parte do país, contribuindo para a
desertificação do interior. Hoje muitas carreiras privadas, mesmo com altas
tarifas, não funcionam todos os dias da semana nem fora das “horas de ponta”
penalizando quem trabalha por turnos, mas também jovens e idosos que não têm
outra alternativa de transporte. Isto é tanto mais grave quando o Governo
encerra serviços públicos básicos (escolas, extensões de centros de saúde,
tribunais,…) por todo o país.
As
Comissões de Utentes de Cascais e Sintra reclamam junto da Administração da
SCOTURB (empresa privada) do mau serviço prestado e das altas tarifas
praticadas: horários sem articulação com a CP; horários sem articulação com
outras carreiras da empresa; informação deficiente dos horários praticados;
velocidades excessivas para cumprir horários; avarias frequentes; carreiras
lotadas; retirada de carreiras aos fins de semana e à noite.
A
Comissão de Utentes de Santo António dos Cavaleiros reclama do mau serviço
prestado pela Barraqueiro (empresa privada): tarifas mais caras; falta de
informação sobre os horários; não adesão ao sistema de tarifas intermodais; não
ligação à estação do metropolitano de Odivelas; poucas carreiras para o
Hospital Beatriz Ângelo, ….
A
Comissão de Utentes de Odivelas reclama mais e melhores transportes para o
Hospital Beatriz Ângelo, nomeadamente que a Rodoviária de Lisboa coloque
autocarros que entrem no recinto do Hospital: Mini ou Midi Bus para além de
carreiras mais frequentes e aos fins de semana.
Estes
exemplos não esgotam os problemas que as populações enfrentam para exercerem o
direito à mobilidade quando não dispõem de transporte próprio.
A
subconcessão/privatização dos transportes públicos na zona de Lisboa e Porto só
vem agravar o problema e retira ao Estado a definição de uma política para a
área da mobilidade que seja incentivadora da utilização do transporte público
em detrimento do transporte individual.
A
introdução de portagens nas ex-scut veio acrescentar ainda mais dificuldades ao
usufruto do direito à mobilidade.
No
caso da TAP, a prosseguir a sua alienação, seria liquidado o setor de
transporte aéreo nacional.
Estamos
mais uma vez perante propostas e medidas que não favorecem os interesses das
populações nem promovem o crescimento económico e a criação de emprego e
permitam garantir condições de vida dignos a todos os cidadãos. A política
desenvolvida pelo governo e que está espelhada nesta proposta de Orçamento de Estado
para 2015, não só leva ao empobrecimento da população portuguesa como lhe
retira direitos fundamentais como o direito à mobilidade.
O
Movimento de Utentes dos Serviços Públicos, como organização dos utentes a
nível nacional considera fundamental a inversão da política seguida e defende,
nomeadamente:
·
Defesa e melhoria do
serviço público de transportes;
·
Não à concessão /
privatização dos transportes públicos;
·
Não à privatização da TAP;
·
Defesa do passe social
intermodal e o seu alargamento a outras zonas do país e a todos os operadores;
·
Exigir o alargamento das
atuais coroas;
·
Exigir melhor articulação e
coordenação entre os vários meios de transporte e operadores;
·
Abolição das portagens;
·
Manutenção das condições de
segurança das vias rodoviárias, com realce para a melhoria dos pavimentos e
sinalização vertical e horizontal.
É
necessário uma mudança de política que tenha em conta os interesses das
populações.
Lisboa, 21 de novembro de
2014
Movimento de Utentes dos
Serviços Públicos