22/11/05

MPI - Movimento Pró Cidadania e Ambiente

5º Encontro Nacional do MUSP


Ambiente e saúde pública

Nas últimas décadas, verificou-se uma compreensão crescente de que a qualidade do nosso ar, água, solo e alimentos afecta a qualidade da nossa saúde e das nossas vidas. Isto vai desde o aumento das alergias (particularmente nas crianças), das doenças respiratórias e dos cancros até à perturbação dos sistemas endócrinos e reprodutivos e à morte prematura.
Várias são as substâncias na lista negra, como por exemplo as dioxinas, pesticidas, metais pesados (usados em pilhas, baterias, tintas). As dioxinas são dos mais tóxicos compostos químicos conhecidos, são cerca de 30.000 vezes mais venenosos que a estricnina, basta um grama para que 100 milhões de pessoas tenham absorvido a quantidade máxima de dioxinas para toda a sua vida, ou seja, a quantidade de dioxinas que um ser humano pode suportar são 10 nanogramas. Acumulam-se no líquido amniótico, glândula mamária (e, consequentemente, saindo pelo leite materno), no cérebro, na gordura de peixes de águas frias (exemplo: salmão), etc. A massa anual de dioxinas e furanos (cancerígeno) monitorizada na incineradora de S.João da Talha, em 2003, foi de 19 mg, segundo a VALORSUL.
Algumas estatísticas:
- Hoje na Europa, 15 % dos casais são estéreis. A poluição química pode ser uma das causas de esterilidade.
- Na Europa, uma em cada sete crianças é asmática, possivelmente devido à poluição das vilas e das habitações e 34% das mortes verificadas em crianças e jovens até aos 19 anos se devem à poluição, má qualidade da água, a produtos químicos e a acidentes.
- Na Europa, há mais 1% de novos casos de cancro por ano na infância.lh

Os aterros sanitários e a saúde pública

Os aterros sanitários são infra-estruturas que possuem sempre impactes negativos sobre o ambiente e a saúde das populações, pelo que devem ser tomadas inúmeras medidas para minimizá-los, como a escolha criteriosa da sua localização e depositar apenas o que não for passível de reciclagem, com destaque para a matéria orgânica, principal responsável pelos maus cheiros e pela produção de lixiviados.
No caso do Aterro Sanitário do Oeste, há fundado receio que pela sua localização em área de REN, na zona de recarga do principal aquífero da região Oeste, o sistema aquífero dos Grés de Torres Vedras, e muito próximo de várias povoações, principalmente do Olho Polido a escassos 70 metros do limite do terreno comprado, quer pela deposição da quase totalidade dos lixos domésticos produzidos.
Sabe-se que alguns constituintes menores do biogás libertado pelos aterros possuiem efeitos cancerígenos, mutagénicos e teratogénicos, para além de serem normalmente os responsáveis pelos odores associados ao biogás (constituído essencialmente por dióxido de carbono, metano e sulfureto de hidrogénio). O sulfureto de hidrogénio em concentrações superiores a 20 ppm pode provocar efeitos crónicos (Petts et al, 1994). Sendo que a emissão do biogás começa a partir do 6º mês após a deposição dos resíduos e verifica-se num período de 15 a 30 anos depois do encerramento, podendo ir até 100 anos (Williams, 1998)!
Ainda há poucos estudos epidemiológicos, temos conhecimento de um estudo inglês recente (2002) que concluiu que viver perto de um aterro sanitário (numa área de 3 Km de distância) aumenta o risco de ter filhos com defeitos congénitos, o que pode ser devido aos compostos químicos gerados nos aterros.
Os metais e químicos tóxicos podem infiltra-se nos lençóis freáticos ou poluir o ar durante o transporte ou a gestão do aterro, segundo afirma o grupo ecologista Friends of Earth (Amigos da Terra).

A gestão dos RSU (Resíduos Sólidos Urbanos)

O lixo doméstico (ou RSU) que produzimos, é reciclável em cerca de 70%, pelo menos, sendo aproximadamente 30% de matéria orgânica, 18% papel/cartão, 10% plásticos, 7% vidro, 2,5% metais, 1% embalagens compósitas (tetrapak) (correspondendo a 25% de embalagens). No entanto, no caso da RESIOESTE, por exemplo, em 2004 foram recolhidos selectivamente apenas 3,7% do total de RSU produzidos, sendo o restante depositado no aterro!
Cada português produz em média 1,3 Kg de lixo por dia!
Para 2005, as metas de reciclagem são 25% do total das embalagens, sendo no mínimo 15% para cada material. Ou seja, a recolha selectiva teria de ser de mais de 10% (assumindo um refugo de 25% e, para além disso, nem tudo o que é recolhido selectivamente são embalagens).
As vantagens da reciclagem são incontestáveis, assim: ao reciclar uma lata de alumínio poupa-se a energia necessária para uma lâmpada de 100W funcionar durante 100 horas; na produção de papel a partir de papel usado há uma redução para metade no consumo de energia, de 70% no consumo de água e de 95% da poluição atmosférica; uma tonelada de papel reciclado equivale a cerca de 15 a 20 árvores poupadas; reciclar papel poupa 3 vezes mais energia do que a que se obtém queimando esse mesmo papel e no caso dos plásticos poupa-se 5 vezes mais.
O SIGRE (Sistema Integrado de Gestão de Resíduos de Embalagem) não apresenta racionalidade económica (e muito menos empresarial), não é governado e nem sequer existem referências para práticas de boa gestão.
A directiva sobre deposição de resíduos em aterro, entretanto transposta para o direito nacional D.L. 152/2002, de 23 de Maio (não obstante merecer críticas, pois estabelece metas pouco ambiciosas), obriga a reduções na matéria orgânica a depositar em aterro, redução que deverá atingir 35% até 2016.
Face a esta disposição legal foi elaborada a “Estratégia Nacional para a redução dos Resíduos Urbanos Biodegradáveis (RUB) destinados aos Aterros”, que prevê a instalação de várias unidade de digestão anaeróbia, para produção de uma energia renovável, o biogás, através de fundos do IIIº Quadro Comunitário de Apoio.
Inexplicavelmente, o governo aprovou um novo tarifário da electricidade através de energias renováveis (D.L. n.º 33-A/2005, de 16 de Fevereiro), em que sai penalizada a digestão anaeróbia passando de 0,065 €/kWh para 0,055 €/kWh. O que, para além de comprometer a viabilidade económica destas unidades entra em contradição com o próprio Protocolo de Quioto e com diversos documentos relativos às alterações climáticas, nomeadamente o PNAC – Programa Nacional para as Alterações Climáticas, em que é referida a importância do biogás para controlar emissões de gases com efeito de estufa.
Incrivelmente, a incineração de resíduos urbanos e o biogás proveniente da matéria orgânica depositada em aterro são premiados, com uma tarifa de 0,076 €/kWh (a anterior tarifa era de 0,065 €/kWh) e 0,105 €/kWh, respectivamente.


Os alimentos transgénicos

A polémica em torno dos alimentos transgénicos não é recente, mas ganhou nova actualidade devido à autorização, em conselho de Ministros, para o cultivo com fins comerciais de 17 variedades de milho transgénico, no passado mês de Abril, na sequência da aprovação pela Comissão Europeia em Setembro de 2004.
Apesar da legislação muito complexa, não há qualquer garantia de que os OGM (Organismos Geneticamente Modificados) ou transgénicos aprovados sejam seguros para a saúde, porque, por exemplo, não são exigidas análises aprofundadas, os únicos testes disponíveis são realizados pelas próprias empresas que os comercializam! Sabe-se ainda que, por exemplo, nos Estados Unidos aumentaram 2 a 10 vezes as doenças causadas pela alimentação a partir de 1994 (o ano em que começou a venda de alimentos transgénicos nesse país!), não é possível afastar a hipótese de que os transgénicos causem cancro e deficiências imunitárias, conforme o comprovam alguns (poucos) estudos, cujas conclusões são silenciadas e os próprios cientista são expulsos por se atreverem a investigar e publicar o que não agrada à indústria.
Mas, é preciso ainda ter em conta que os OGM’s podem representar um risco para o ambiente, pois uma vez libertos na Natureza, os transgenes não poderão ser recuperados, o que representa um risco para gerações futuras, para os agricultores e a agricultura pela dependência em relação às empresas que produzem sementes transgénicas (protegidas por um sistema de patentes que impedem os agricultores de guardar sementes, pelo que terão de comprar sementes novas), e porque as culturas transgénicas produzem menos, deterioram o solo, favorecem o aparecimento de pragas resistentes a grandes quantidades de um ou mais pesticidas (superpragas), são mais caras ao agricultor, etc., etc..
A própria directiva 2001/18 reconhece que os efeitos da libertação dos OGM no Ambiente podem ser irreversíveis!
Por outro lado, nas sondagens aos consumidores da Europa, a maioria não quer comer OGM, pelo que o principal mercado destes produtos são as rações para animais, uma vez que não há rotulagem da carne quanto ao tipo de alimentação a que os animais foram submetidos.


Em conclusão, é urgente:

1- Que Portugal desenvolva um Plano Nacional de Acção em Matéria de Ambiente e Saúde, com ampla participação da sociedade civil (compromisso assumido em 1994 na 2ª Conferência Interministerial sobre Ambiente e Saúde, em Helsínquia) e O Plano de acção específico para crianças, segundo compromisso assumido na 4ª Conferência Interministerial, em Budapeste, 23 a 25 de Junho de 2004.

2- A promoção de uma gestão sustentável dos RSU, contribuindo-se assim para uma diminuição da libertação de substâncias nocivas para o ambiente, que passa por:
2.1- Revisão do tarifário sobre energias renováveis, de modo a promovê-las.
2.2- Incentivo à redução de resíduos pela aplicação de taxa variável ou tarifas proporcionais à quantidade de resíduos produzidos por cada família.
2.3- Desenvolver um processo de reengenharia do SIGRE com vista ao aumento da sua eficiência.
2.4- Aumentar a reciclagem, e consequentemente diminuir a deposição em aterro e a incineração, não apenas com o objectivo de cumprir as metas impostas para reciclagem de embalagens, mas também como forma de poupar recursos naturais e energia, através de:
· Investir mais nas recolhas selectivas, principalmente na recolha selectiva porta-a-porta.
· Planear sistemas de recolha, processamento e reprocessamento por material e por fluxo de resíduos e não por fonte, viabilizando assim a recolha selectiva porta-a-porta e unidade de tratamento para resíduos biodegradáveis (matéria orgânica) em zonas de menor densidade populacional, por exemplo.
· Investir em unidades de Tratamento Mecânico e Biológico, para triagem de resíduos indiferenciados e tratamento da matéria orgânica.
· Investir na educação ambiental, com destaque para a compostagem doméstica.

3- A aplicação de uma moratória ao cultivo de OGM’s em Portugal, à semelhança da Hungria, Itália, Áustria e Polónia, de modo a garantir a aplicação do Princípio da Precaução e proteger a agricultura e os agricultores portugueses.





Vilar, 19 de Setembro de 2005

A Direcção